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Neve na primavera

'Não tenho mais dezessete anos!' Acho que já repeti esta frase mais de uma vez nos últimos anos, e acho que repeti mais algumas vezes no fim de semana. Já escrevi e re-escrevi trechos para este post várias vezes, mas todos eles começaram com esta frase. Não quero, com isso, dizer que me sinto triste por estar envelhecendo, ou que eu queria voltar no tempo para aproveitar melhor a vida, coisas que a gente ouve muito seguidamente por aí e que não tem nada a ver comigo, pois não me arrependo de ter feito ou deixado de fazer qualquer coisa na adolescência. Mas a verdade é sigo vivendo uma 'vida de estudante, sem rotinas e timetables muito restritivos, e também nunca vivi um relacionamento realmente sério, que me propiciasse uma expectativa de constituir família, et cetera e tal. Por isso, acho que às vezes custo a cair na realidade de que deixei de ser um adolescente, e por muitas vezes concordo com a visão de adultos do 'Pequeno Príncipe' de Exupery. Mas, às vezes noto que eu mudei muito... Muito por causa do tempo, mas também muito por causa das despedidas e da solidão. E o que me assusta, é aquilo q o Oswaldo Montenegro, na música 'A Lista', pergunta: "Quantos defeitos sanados com o tempo eram o melhor que havia em você???"

Meu 'feriadão' começou na quinta-feira. Saí às pressas de casa para me reunir com o meu orientador, e foi uma daquelas reuniões que realmente valem a pena... Mesmo que o tópico tenha sido bastante abstrato, e ainda não tenhamos chegado num consenso, ao menos posso sentir tanto que ele respeita minha opinião, e que nosso trabalho está tomando forma e rumo. Saí de novo às pressas para pegar Carlinha em St Pancras, vinda da Bélgica para passar o findi comigo. Dali, passamos em casa, saímos para comer algo e fomos para um Pub em SoHo para tomar uns pints de Guiness. Fechamos a noite tomando um banho de chuva, às margens do Thames, ao lado do Westminster Palace (ouvindo as badaladas do Big Ben), mas a tempo de pegar o Tube para voltar para a casa.

No dia seguinte, fomos pegar a Lucíola na estação, e o fim de semana passou a tomar uma forma diferente. Através dela, conhecemos o Evandro, e conseqüentemente uma visão bem mais experiente da vida e da noite em Londres. Com ele, fomos para um club perto de Victoria Station, e a partir daí eu comecei a repetir para mim mesmo: 'Não tenho mais dezessete anos!'. Não que o lugar fosse ruim, mas a minha tolerância para a música eletrônica (e, por música eletrônica, quero dizer música techno e assemelhadas, posso ter sido mal-entendido no decorrer da semana) é ainda menor do que era há alguns anos atrás. E esta tolerância é ainda menor se estou em um lugar onde a cerveja é cara. Ainda naquela noite, comecei a me dar por conta que eu estava me tornando cada vez mais ranzinza com meu bairrismo com relação às expressões culturais... mais especificamente, escrevi em algum canto que:

"Acho que está me faltando paciência para tentar assimilar a música techno/eletrônica/whatever como uma nova manifestação cultural, adaptada ao desenvolvimento tecnológico para a criação de ritmos e melodias... Tudo que eu me pergunto durante a festa era se milênios de evolução para desenvolver o dom da linguagem, mais alguns séculos de história organizando este dom em versos e trovas para demonstrar o que há de mais belo e profundo no sentimento humano, não valem mais nada? Aos meu ouvidos, me parece que este povo coloca uma batida pesada num emaranhado de sons, e às vezes 2 frases repetidas no meio, que são menos representativas que o barulho de um pica-pau cavucando um tronco oco ou um quero-quero no banhado anunciando sua insatisfação com um visitante indesejado na volta do seu ninho."

Fechamos a noite indo para a casa do Evandro, por um erro no meu planejamento - não levei em consideração que não é todo o lugar que dá para fazer festa até às 6 da manhã, e não planejei o Night Bus para voltar para a casa. Mas, mesmo com minhas restrições a festa e à música, a noite foi muito legal pela companhia: além de grandes companheiros de festa e trago, encontrei um pouco da boa e velha hospitalidade gaúcha.

O sábado já começou meio que pelo avesso por causa deste meu erro. Já era mais de 11 da manhã quando saímos da casa do Evandro, e as gurias estavam loucas para experimentar o tal do 'English Breakfast'. Mais uma vez, repeti para mim mesmo que 'não tenho mais dezessete anos', e a idéia de comer bacon, ovo frito e salsicha (com uma idéia distorcida de feijão com molho vermelho) depois de uma noite de trago já me deixava com náusea só de pensar. Mas, dentro do tube, me dei por conta que minhas manias já estavam começando a atrapalhar os outros, e dei o braço a torcer para descermos em Leicester Square e comermos o tal breakfast - confesso que caiu bem melhor do que eu pensava. Dali, continuamos caminhando pelos pontos turísticos, no que seria um passeio bem divertido se não fosse as pancadas de chuva e neve no meio do caminho. Na verdade, por estar bem vestido, a chuva não me incomodou tanto, e a neve foi mais um incentivo do que um incomodo (principalmente depois de tomar um sorvete de morango - meu lado infantil não pode resistir ao prazer de tomar um sorvete num dia de neve). Mas, para as gurias, o clima não estava tão confortável assim, e agilizamos o passeio para chegar logo em casa e tirar as roupas molhadas. Mais uma vez, me dei por conta de que 'Não tenho mais dezessete anos', quando o programa que escolhemos para a noite foi comer uma carnezinha assada no forno e ficar tomando um vinhozinho em casa.



O domingo fechou o feriadão com chave de ouro. Devidamente descansados, saímos para passear no Portobello Market (Notting Hill) que não estava lá muito legal, creio q por ser feriado. Almoçamos por ali e depois fomos para St Paul's Cathedral, dando uma volta pelo Thames e caminhando até a Tower Bridge. Mais uma vez, tenho que agradecer ao Evandro pela companhia, pois sem o conhecimento dele sobre a cidade eu talvez não tivesse apresentar muito de London para as gurias. Na foto acima, Carlinha, eu e Lu - London é o tipo de cidade em que ninguém dá bola para o que vc veste, mas acho que descobri o limiar para isso: meu poncho e meu chapéu chamaram mais atenção do que eu imaginava, de uma tia que veio conversar comigo até uns babacas tirando foto :P. No fim da noite, mais uma festa, mas desta vez um lugar bem mais legal, com cerveja mais barata e uma musiquinha mais agradável, além de mais uma figurinha maluca que reforçou minha teoria de que não vou conseguir entender as mulheres européias. Na saída da festa, ainda curtimos um passeio noturno na volta do Thames, de novo curtindo as luzes do Big Ben e do London Eye, com um 'Minuano' batendo e uma temperatura suavemente desconfortável (com os vidros dos carros congelados e tal).

Segunda-feira foi o dia de juntar os cacos... com a neve caindo na rua, e uma dor de garganta, passei o dia dormindo e sentindo que, realmente, não tenho mais dezessete anos.
Ainda assim, mesmo que eu talvez tenha deixado o inverno realmente entrar na minha vida nos últimos meses, que esta temporada em London esteja me tornando mais frio ou mais cinza, vem aí uma nova primavera... E com a companhia de bons amigos (e algumas indiadas), pude perceber que não vai ser alguns flocos de neve fora de época que vão me congelar!!!

Venha...
O amor tem sempre a porta aberta...
E vem chegando a primavera....
Venha, que o que vem é perfeição!!!

Happy St Patrick's Day

Certa feita, lá pelo século quinto, diz que havia um índio loco de bueno, que ainda piazote se tornou escravo lá pelas bandas da Irlanda. Mas o índio era tão guapo que conseguiu fugir, daí virou padre para atender os desejos da família, e se bandeou de novo para a tal da Irlanda, e não restou um vivente por lá que não respeitasse ele, tanto que 15 séculos depois o povo Irlandês ainda enche a cara de cerveja em sua homenagem. Aliás, esta tal de Irlanda parece ser um lugar flor de especial, q os nativos tomam trago nos dias santos (ou será q é em todo santo dia), e além disso tem dois grupos que até pouco tempo atrás viviam peleando, tal como Chimangos e Maragatos (inclusive, há algum tempo atrás presenciei uma discussão de dois destes viventes, e quase tivemos que tirar as facas do recinto).

Bueno, mas meu causo de hj, dois dias depois do dia que se comemora o tal do Patrick, não tem muito a ver com a Irlanda. Na verdade vou falar mesmo sobre minha viagem para Amsterdam, capital dos Países Baixos - e aqui quero corrigir um equívoco que cometo há muito tempo, o nome correto do país é 'Reino dos Países Baixos' ('Koninkrijk der Nederlanden', na linguagem neerlandesa), e não Holanda, que é apenas uma região do território. Da mesma forma, a línguagem é o neerlandês (nederlands), e não o holandês, conforme eu costumava chamar. Tendo corrigidas as definições sintáticas, deixe-me voltar ao que eu estava contando...

Semana passada foi daquelas ao meu estilo... trabalhando como um louco para fechar um artigo a tempo para um 'deadline', mas cheio de boas notícias (Dodonho, parabéns pela casa nova, e Mário, parabéns pela segurança financeira para mais um tempo de pesquisa). Daí, em conversa com Carlinha (a mineira mais Gaúcha que já existiu), decidi acompanhar ela e a Lucíola (outra grande parceria de festa e trago) para uma viagem a Amsterdam. Por ser decisão de última hora, para variar (e também pelo preço, é claro), comprei a passagem para o ônibus daqui para lá (aproximadamente 12 horas de viagem).

Mas, como sócio vitalício da FUNAI, sei bem que o lado positivo de toda indiada (a.k.a. programa de índio, para quem não está acostumado com o termo) tem como sua principal vantagem aquelas situações inusitadas e divertidas, que fazem com que 'o viajar seja mais do que a viagem' (parafraseando Herbert Vianna). Mesmo tendo voltado direto para o campus em Londres e ficar com os pés molhados ou gelados por quase 24 horas, por passar a tarde de domingo tomando banho de chuva pela cidade (para não dormir na estação depois das gurias terem ido embora), não me arrependo de mais alguns lugares muito legais que pude conhecer. Mas a viagem de ida é que reservou, realmente, boas risadas em ao menos duas situações. A primeira delas foi a pausa antes do ônibus entrar na balsa que atravessa o Canal da Mancha, onde eu fiquei no ônibus vendo um filmezinho do Chuck Norris, quase sem som e legenda em Neerlandês - e das duas uma: ou eu manjo muito de Neerlandês inconscientemente, ou o que o povo fala nestes filmes não faz a menor diferença para o entendimento da trama. A outra cena impressionante foi no convés da balsa, onde um grupinho de umas 15 pessoas, de ambos os sexos, estavam sentados em volta de uma mesa tomando cerveja. Até aí, nada demais, não fossem duas da madrugada de uma noite de inverno, batendo um vento forte (enfim, quase um frio Piratinense) e o pessoal usando apenas roupas íntimas - já deixo lançado o desafio à resistência ao frio do povo de Piratini.

Indo para o que interessa, Amsterdam é uma cidade ao menos interessante. É sabido que, na cidade, existem estabelecimentos onde o consumo de drogas é liberado (os chamados Coffeeshops). Além disso, um dos 'pontos turísticos' da cidade é o 'De Wallen', ou distrito da luz vermelha (dispensa mais explicações), além é claro das diversas lojas de produtos eróticos e até mesmo um 'museu do Sexo'. Ou seja, em outras palavras, é uma 'putaria organizada' (parafraseando Zé Cascaes). E, é claro, nada melhor para aproveitar a cidade que ficar hospedado num hostel há poucas quadras de qualquer destas 'atrações'. Como nada é perfeito neste mundo, ocorreu q este hostel era católico, com 'curfew' (toque de recolher) às 2 da manhã, e sessões opcionais de 'Bible discussion' (a qual não participamos, por razões óbvias). Mas este foi apenas um imprevisto da nossa equipe de escolha de hostel, e não devemos condenar ninguém pelo ocorrido :P. Ainda mais estupidez foi a do vivente que pagou para entrar em um Jardim Botânico para conhecer um pouco das famosas flores holandesas (o uso termo aqui não é incorreto), sem se dar por conta de que é inverno no hemisfério norte - neste último caso o babaca fui eu mesmo!!!!

Imprevistos e bobagens a parte, o tempo que passamos lá foi divertidíssimo. Para quem conhece as gurias, nem preciso dizer q a companhia delas foi maravilhosa, seja nas cervejas a preço de ouro que bebemos por lá, ou pelos passeios turísticos pelos diferentes pontos da cidade, incluindo as divertidas visitas ao tal do museu do sexo e a caminhada pelas ruas da tal da 'De Wallen' - e aqui tenho a obrigação moral de fazer um comentário aos amigos que tem interesse neste tipo de comércio: se vcs acham baixa a qualidade da Garibaldi em POA, ou a Praça Cel. Pedro Osório em Pelotas (há alguns anos atrás, não sei como está agora), só posso dizer que são um harém se comparado aos tipos que se encontram em Amsterdam.

Mas a grande diversão mesmo foi a noite. Não sei ao certo se isso é caretice ou covardia, mas a única erva que consumimos por lá foi a do mate cevado no fim da tarde - e ainda assim considero que nos divertimos bastante. Saímos pela noite em busca de um canto legal para beber e, depois de uma longa volta achando apenas lugares com fila, ingresso pago ou cerveja cara, encontramos um 'pub' irlandês - e foi ali que me dei de conta que era a semana que se celebra o tal do Patrick mencionado acima. Bem, nem preciso tentar usar adjetivos para descrever uma celebração de St. Patrick, em um pub Irlandês, com boa companhia, bebendo Guinness e ouvindo música celta ao vivo: acho que os fatos falam por si mesmo.




Para encerrar com chave de ouro, o domingo chuvoso pode ter atrapalhado nossa vontade de fazer um pouco mais de turismo, mas teve um chimarrãozinho pela manhã e o almoço em uma 'churrascaria' argentina, cuja decoração fazia lembrar os galpões dos CTG no meu Rio Grande. Nestes momentos é que temos que olhar para nós mesmos e admitir que, culturalmente, estamos em alguns aspectos mais próximos dos Hermanos do que do povo Brasileiro - claro, que as semelhanças pararam por aí, pois mesmo que estivesse bem no ponto, não me atrevo a chamar de churrasco aquele pedaço pequeno de carne com uns vegetais na volta.

Para encerrar, só queria dizer que passar o fim de semana entre costumes gaúchos e irlandêses em plena Amsterdam, só me mostrou mais uma vez que muitos dos grandes pontos turísticos da Europa acabam pecando pela falta de identidade em sua cultura popular. Mesmo que Amsterdam seja uma cidade muito bonita, com inúmeros atrativos, ainda assim a sua identidade para os turistas é a maconha e o mercado do sexo (o que, convenhamos, se encontra em qualquer lugar do mundo). Da mesma forma, viver em Londres tem mostrado isso, que com tanta coisa interessante, com tanto ponto turístico e tanta cultura diferente integrada, estes lugares acabam pecando pela falta de uma identidade, e como a Giulia dizia, parece que as pessoas que moram por aqui acabam impregnadas por este vazio. Deixo esta frase como um alerta às pessoas que estão aí do outro lado do oceano: se querem conhecer coisas interessantes, não precisam atravessar o Atlântico, às vezes basta atravessar a rua. Temos q valorizar CTGs, os forrós, os sambas de roda ou as rodas de capoeira... derrubar os orgulhos para deixar um tango Argentino ou a história Mineira também tocar nossos corações. Enfim, saber aproveitar o que esta América Latina pode nos proporcionar, pois mesmo que os governos não consigam prover a mesma estrutura turística que os países da Europa, por aqui eles nunca vão alcançar aquilo que temos de melhor: a alma e o sangue latino.

Bem, em breve colocarei um álbum com algumas das fotos que tiramos por lá. Mais uma vez, agradeço às gurias, pela companhia tão gostosa, e por um dos fins de semana mais divertidos desde que cheguei por aqui. A foto no meio, somos eu e as gurias no Pub, e a de baixo é uma que estava faltando no meu histórico: a de um chimarrão cevado na Europa. Abraços a todos.